Se as impressoras 3D fossem construtores perfeitos como os replicadores de Jornada nas Estrelas, não haveria nem sentido em mencionar acabamento: afinal, as peças teriam saído prontas, acabadas, da máquina. Praticamente toda tecnologia de fabricação humana tem sua etapa de processamento final e preparação para uso, e todas as diferentes técnicas de impressão 3D também seguem essa regra. O problema se encontra quando este acabamento consiste de tarefas manuais, laboriosas e não automatizáveis — o que acaba acontecendo, visto que o que é automatizável acaba entrando para o fluxo de trabalho da impressão 3D.
Em suma, quando mencionamos acabamento neste contexto, tratamos desta parte avessa à automatização. Seu caráter manual e dependente de talento individual tira o caráter tecnológico da tarefa e o coloca mais próximo de "arte"; e como arte, acaba sendo algo que necessita não só da teoria, mas de muito refinamento pela experiência e prática, além de talento, vocação, paciência, bom senso e outras virtudes. O livro "O Artesão" de Richard Sennett propõe que para se tornar habilidoso em qualquer área são necessárias 10 mil horas de prática, ou 8 horas por dia, todos os dias, por 4 anos. Muitos dos recém-chegados na impressão 3D podem acabar caindo na armadilha de autoconfiança que a tecnologia traz, e ignorar completamente que suas máquinas caras e refinadas não dispensam a finalização manual e o talento individual (e isso vale inclusive para o fatiamento, que veremos mais adiante), fabricando peças muito aquém do que poderiam fazer e se frustrando com a área.
Ainda, não existe um conjunto fechado e bem estabelecido de técnicas e ferramentas para finalizar as peças. O tratamento de plástico impresso vai herdar práticas do plastimodelismo, da carpintaria, do tratamento industrial de injetados, do artesanato e escultura e de tantos outros campos, e adicionar na mistura suas próprias descobertas e variações do universo Maker, como o já estabelecido tratamento químico por acetona, explicado mais adiante. As instruções aqui devem ser tratadas, portanto, como um guia geral incompleto e resumido, com dicas que podem nem mesmo servir para todos os casos.
Adicionalmente, outro problema da necessidade de acabamento das peças é que os riscos da impressão 3D se estendem a essa etapa, não se resumindo aos já conhecidos das altas temperaturas da impressora, às suas conexões elétricas, aos seus resíduos ou às forças mecânicas; o acabamento traz seus próprios reveses, muitos dos quais, em seus campos especializados, exigem cursos de proteção e cuidados que podem durar semanas (os vapores solventes são um exemplo). Fique portanto explícita a advertência que, por mais que esta obra dê direções gerais de precauções, o leitor deve consultar as referências externas para melhor segurança.
Cada técnica diferente de acabamento pode exigir ferramentas diferentes, mas existe um conjunto básico e comum a muitas delas que vale ser sugerido. É importante perceber que não é necessário ter todas as ferramentas descritas para conseguir um bom acabamento; no entanto, quanto maior a variedade, mais fácil se tratarão os casos difíceis. As mais importantes de todas são as que mitigam o risco dando maior segurança às operações:
Na indústria, tais proteções são tratadas com a nomenclatura "EPI" (Equipamentos de Proteção Individual). Os mais importantes para nossos casos:
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Máscara de poeira — usada por profissionais de marcenaria, útil para quando se removem suportes e lascas das peças impressas e também nas ocasiões em que se faz desbastamento e lixamento. As poeiras de plástico são quimicamente resistentes e podem trazer obstruções do trato respiratório. Note-se que a máscara precisa estar justa e sem vãos e não protege contra vapores químicos nem nanopartículas.
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Luva de kevlar / de aço com 4 fios — ainda que aja variados tipos de luvas protetoras para o trabalho com ferramentas cortantes ou desbastamento, essas são as que sugerimos baseadas no equilíbrio entre sensibilidade e proteção. Ajudam a evitar os cortes por partes pontiagudas ou afiadas. São vendidas em tamanhos diferentes, é importante comprar do tamanho certo porque luvas largas demais podem deixar os instrumentos escaparem e prejudicar a sensibilidade, e luvas muito pequenas podem simplesmente não caber, visto que os materiais de que são feitos não são elásticos.
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Máscara de gás — ainda que inicialmente a sugestão do uso de máscara de gás para a impressão 3D pareça um exagero, ela não é um insumo muito caro (algumas dezenas de reais) e serve para variadas situações de acabamento, como pintura e revestimento das peças e, claro, o acabamento químico com vapores solventes. Os melhores modelos são os que ao invés de terem óculos de proteção separado são uma peça só que cobre o rosto, como se fosse um capacete de astronauta: dão ótima visibilidade. Os filtros usados são filtros comuns contra vapores orgânicos usados por pintores, que devem ser trocados a cada 6 meses.
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Exaustor / ventilador — para ajudar a remover ou arejar os vapores químicos, solventes e nanopartículas; evitar ar parado.
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Óculos de segurança — óculos de plástico resistente próprios para evitar que os olhos sejam afetados pelos vapores e líquidos. Os mais recomendados são o que vedam a entrada de vapores.
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Luvas de nitrilo descartáveis — as conhecidas "luvas azuis" que aparecem em seriados médicos são luvas de borracha resistentes a punção e a vapores e solventes como os tipicamente usados em pintura e acabamento químico. Após o uso, devem ser embaladas para descarte1. As luvas de látex comuns são mais baratas mas oferecem maior risco.
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Jaleco ou Macacão de proteção química complementam o conjunto quando se usa a máscara de gás, junto a protetores de cabelo ou capacetes que evitam que os líquidos e gases contaminem o corpo. Essas roupas devem idealmente ser confortáveis e folgadas para minimizar rasgões e puxões do tecido. Após o uso, devem ser imediatamente colocadas para limpeza.
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Sapatos ou botas com sola de borracha ou outro material antiderrapante.
Cada proteção tem seu escopo e método correto de uso, com algumas diretivas como não reutilizar embalagens de produtos químicos, descarte adequados dos itens e resíduos, realizar a operação em ambiente ventilado e longe de fontes de combustão ou elétricas, crianças e animais. É aconselhado também ter um procedimento de limpeza para antes e depois das operações e principalmente um procedimento de emergência com atendimento médico e hospitalar caso as proteções falhem. Para empresas, tais medidas são obrigatórias sob a legislação vigente.
Note
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Nota:
Ainda que seja inviável tratar todos os usos de insumos químicos na impressão 3D, geralmente eles têm muito em comum com a indústria de tintas e solventes, e um documento especialmente útil para entender políticas de descarte é o "Manual de preparação de tintas e vernizes, limpeza e descarte de embalagens" da WEG Tinta e Vernizes, disponível em http://ecatalog.weg.net/files/wegnet/WEG-manual-de-preparacao-de-tintas-e-vernizes-e-limpeza-de-embalagens-manual-portugues-br.pdf. |
As ferramentas de corte são primordialmente usadas de duas maneiras: para remover arestas, fiapos e imperfeições, e para remover estruturas de suporte e raft, isto é, partes do plástico que foram impressas apenas para apoiar seções da peça (mais detalhes sobre o suporte você terá na seção de fatiamento). Não abordamos ferramentas elétricas e industriais de corte porque além do excesso de opções, fogem ao escopo do livro.
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Alicate de corte diagonal — serve para tirar fiapos, cortar seções finas e aparar arestas. Tem uma seção mais chata de bico que pode ser encostada na peça para cortar com segurança as imperfeições.
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Alicate para cutículas — é equivalente ao alicate de corte diagonal, mas bem menor. Serve para seções mais frágeis da peça ou trabalho de detalhes. Aconselha-se comprar os modelos com haste de plástico por serem mais resistentes.
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Alicate de corte rente — tem o bico chato, sem seção funda, e tamanho geralmente menor que o de corte diagonal. Consegue penetrar mais nos detalhes.
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Alicate de corte turquesa — a seção cortante deste alicate é frontal e não lateral. É usado quando a geometria da seção a ser aparada dificulta o cabo no sentido do corte.
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Navalha / estilete — tanto um quanto o outro são úteis na retirada de fiapos, bolhas e imperfeições do plástico, mas são instrumentos de uso mais perigoso que alicates por seu fio afiado. Não se deve usá-los "puxando", sempre com um movimento de fora para dentro. Sugere-se usar tais instrumentos com luva anticortes.
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Rebarbadora manual — é um substituto seguro e muito mais ágil do estilete para alguns casos particulares, como apara rápida de cantos. Tem um fio da lâmina que gira no eixo da manopla do instrumento acompanhando o contorno do corte, podendo ser guiado pelo dedão pelo lado rotundo; geralmente é comprado com várias lâminas facilmente substituíveis.
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Alicate universal — o alicate de bico grosso serrilhado e meia-lua de corte que é comum em todo lugar. Não é especialmente útil na impressão 3D, mas dado que é facílimo de encontrar e tem várias utilidades, pode servir para firmar peça, arrancar suportes de seção maiores e até cortar arestas.
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Alicate de bico fino ou meia-cana — disponível em modelos diferentes, o alicate de bico fino costuma ser mais útil na impressão 3D por entrar facilmente nas reentrâncias, permitindo o alcance fácil das partes mais bloqueadas e a aplicação de força localizada com um leve girar do instrumento. Pode ainda fazer as vezes de pinça para puxar filamento quente do bico ou remover sujeiras do início de impressão.
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Alicate de bico curvo — é um modelo especial de alicate de bico fino em que o bico começa reto mas faz uma curva de 90°. Utíl para reentrâncias mais difíceis em que os alicates finos comuns não conseguem penetrar.
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Alicate de pressão — é um tipo de alicate regulável que pode ser fixado numa mordedura específica de modo que, com a ajuda de uma mola que faz pressão na abertura, prenda a peça com firmeza para ser trabalhada.
O lixamento de peças é talvez o tipo de acabamento de aparência mais básico e representativo da esfera de impressão 3D. Básico porque representa um mínimo que se espera de pós-processamento das peças para exposição, e representativo porque representa um trabalho não exatamente de alto cunho artístico, mas laborioso, demorado e que aumenta desproporcionalmente com a complexidade da peça, sendo candidato a ser um dos "custos escondidos" de um serviço de impressão 3D. Além disso, o resíduo desse acabamento — o pó de plástico — é um potencial perigo à saúde que não raramente é ignorado pelos seus executores. Use sempre a máscara de poeira.
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Lixas — que podem ser em barras, em palitos, em folhas (de tecido, papel etc.) ou ainda em outras disposições — têm um tipo e um número associado. O tipo é de acordo com o material abrasivo que usa para lixar (e portanto que materiais são afetados por ele: uma lixa para madeira, por exemplo, provavelmente usará cristais de granada ou outro silicato vítreo) e o número designa a granulometria ou grana da lixa, quanto menor o número, maior o grão, indo de 16 a 3000 e sendo padronizado pela ISO 6344. Uma lixa de número menor — 60, por exemplo — é mais grossa, servindo pra fazer desbastamento inicial da peça; uma de número maior, como 400, serve para detalhes mais finos ou polimento. Esse é o intervalo sugerido por esta obra. Como o plástico é um material geralmente fácil de tratar, os tipos de lixas comerciais comuns — para madeira, massa e metal — não farão diferença. As lixas geralmente são itens descartáveis, que se inutilizam gradualmente com o uso.
Um tipo de lixa especial e recomendado é a lixa d’água. É uma lixa com papel, grão e cola resistentes a água para que o processo de desbastamento possa ser feito embaixo de um jato d’água ou até submerso, fazendo com que o líquido ajude a carregar a poeira e detritos e impeça que o material aqueça demasiadamente. É especialmente útil para o PLA que é um plástico de baixa transição vítrea, e portanto propenso a se tornar pastoso por aquecimento com a fricção quando se usa lixa comum. A contrapartida da lixa d’água é que se desgasta mais rapidamente.
Uma dica de artesãos para o trabalho com lixas é começar pela de menor grana e ir aumentando em não mais que 50% a cada iteração do trabalho. Por exemplo, começando com uma de 60, não utilizar logo depois uma de 100, mas de 90 ou 80. Esse é um jeito de o grão mais fino conseguir remover o risco deixado pelo grão mais grosso. -
Limas — por vezes confundidas com as lixas, as limas são ferramentas formadas por uma haste dura de aço com ranhuras ao invés de um granulado desbastante. Sua constituição permite que sejam instrumentos permamentes pois não costumam perder o poder de desbastamento. Por serem encontradas em formatos diversos mas especialmente de bastões longos abrasivos, são essenciais e quase insubstituíveis para o tratamento de seções interiores de peças de plástico impressas em 3D. Geralmente são classificadas como "bastardas" (maior abrasividade, destinada a remoção de grande quantidade de material), "de segundo corte" (aplainamento ou ajuste de superfícies para a forma desejada) e "murças" (mais finas, para detalhes e polimento). Recomenda-se para o trabalho de impressão 3D uma lima bastarda e um conjunto de murças de 14cm de diferentes formatos, tudo isto facilmente encontrável em lojas de ferramentas.
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Escovas de aço (e outros metais) — são instrumentos semelhantes a uma escova de dentes mas com cerdas de metal. Sua abrasividade é grande e correspondem a uma lixa com grana baixa. Podem ser usada também para remover poeira e detritos de seções rebuscadas, pois suas cerdas penetram onde outros instrumentos não conseguem.
Ferramentas motorizadas são um alívio de produtividade à tarefa cansativa de desbastamento. É o caso das ferramentas rotatórias de desbastamento e polimento. São indispensáveis para trabalhos intensos, repetitivos ou que precisam de desbastamento localizado. São duas as ferramentas mais utilizadas para isso, e não se esqueça das luvas de proteção e da máscara de poeira!
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Furadeira — é a que a maioria das pessoas tem em casa, usada para trabalhos domésticos, paredes e madeiras. Usa basicamente 3 tipos de brocas1: para metais, paredes e madeira, essa última geralmente com uma adaga no meio que serve de guia. A mais adequada para se usar para fazer furos em plástico é a para madeira, mas nosso interesse é desbastamento. Nesse caso existem hastes especiais para polimento que encaixam no mandril da furadeira e permitem várias conjuntos de lixas e escovas2.
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Microrretífica — também conhecida pelo nome da marca mais famosa no exterior, Dremel, a microrretífica é um instrumento rotatório menor que a furadeira que já costuma vir com uma maleta de acessórios, incluindo várias pontas para polimento3. Tem rotação mais rápida que a furadeira, mas menor torque. Uma modificação que se aconselha usar na microrretífica que a faz muito mais útil para impressão 3D é a colocação de uma haste flexível extensora que permite à ponta giratória entrar em lugares difíceis da peça e o corpo da microrretífica não atrapalhar o acabamento.
Qual usar, a furadeira ou a microrretífica? Em geral a microrretífica se mostra uma melhor opção pro trabalho em peças de impressora 3D, pois já vem com grande variedade de pontas e, sendo menor, é mais facilmente manipulada no ambiente típico de acabamento. Uma precaução a se tomar que vale para as duas ferramentas é que alguns plásticos, como o PLA, como já foi dito, amolecem com a fricção; colocar as ferramentas em rotação menor (e dar pausas no contato com a peça por alguns instantes) é essencial para trabalhar bem com eles — e portanto é importante escolher modelo de furadeira ou microrretífica que tenha controle de rotação. E ainda que não seja um uso indicado, algumas pessoas usam a haste flexível para tratar o plástico submerso ou sujeito a um jato d’água.
Cabe notar que a microrretífica tem também pontas cortantes e de perfuração, servindo para outras tarefas de acabamento.
Note
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Notas:
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Não poderiam faltar as ferramentas térmicas, visto que como o próprio processo de impressão 3D usa temperaturas altas, o acabamento também as acaba exigindo.
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Soprador de ar quente ou pistola de sopro térmico — essa pistola (chamado por vários nomes) é bastante útil no acabamento. As mais fracas têm um sopro que passa dos 400°C, as mais fortes alcançam o dobro disso — portanto é preciso também usá-la com cautela, pois pode gerar queimaduras graves se atingir a pele. Alguns dos usos que se dão a ela:
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Eliminar fiapos. Os fios mais finos de filamento plástico derretem bem mais rápido que outras partes quando o ar quente os atinge.
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Alisar a superfície. Usada com habilidade, o sopro quente pode reduzir ou até eliminar as linhas de camadas das peças; mas é uma tarefa consideravelmente difícil especialmente porque o sopro pode acabar gerando deformação no plástico quente e destruir detalhes mais frágeis.
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Facilitar insertos e encaixes. Quando se imprime uma peça que deve receber um inserto (como um parafuso) e foi impressa bem justa, aquecê-la com a pistola pode amaciar o plástico o suficiente para encaixá-lo no lugar e deixar firme.
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Dobrar ou remodelar peças impressas. Como a tala impressa que vimos nos usos biológicos, o calor pode ser usado em partes grandes da peça para deixar o plástico mole e mudar seus ângulos e conformação; por exemplo, uma mão pode ser impressa aberta mas aquecida e colocada manualmente com os dedos fazendo sinal de "vitória".
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Escrever uma assinatura ou logotipo. Com o plástico aquecido, uma ferramenta de punção ou corte pode deixar um sulco característico na peça.
É preciso "pegar o jeito" com a pistola, portanto é aconselhado ao leitor que pratique com peças velhas ou falhas. O ABS quando aquecido tem uma consistência pastosa bem moldável, e permanece assim por cerca de um minuto até endurecer. O PLA muda de consistência mais rapidamente, ficando bem menos viscoso e também retendo a temperatura por mais tempo por seu alto calor específico.+ Pode não ser muito intuitivo perceber que usar a pistola para colar partes de plástico não costuma dar muito certo. Quando se torna quente o suficiente pra ter poder adesivo, o plástico (seja ABS, PLA ou qualquer outro) já se liquefez e deformou.
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Retouch3D — Este item foi colocado aqui não porque se espera que o leitor tenha ou adquira a ferramenta específica, e sim porque ele passa uma idéia muito prática de como uma categoria de ferramentas térmicas pode ajudar no acabamento. Retouch3D é uma ferramenta eletrônica de mão com pontas de metal intercambiáveis que permite alisar superfícies, ajustar detalhes, remover suportes, consertar contornos e outras tarefas. Necessita de treino pra usar pois é fácil a ferramenta "espalhar" o plástico ao invés de somente aplainá-lo, mas é sem dúvida útil. Como muitos projetos criativos, começou com financiamento coletivo no kickstarter e hoje tem a venda internacional por http://www.retouch3d.com.
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Ferro de solda velho — Um ferro de solda está entre as ferramentas térmicas mais baratas que se pode comprar, especialmente um ferro de baixa potência como de 20 ou 30W. É um substituto razoável para fazer um trabalho parecido ao Retouch3D, mas peca pela temperatura excessiva (o que faz com que espalhar ou deformar o plástico acabe acontecendo mais) e a falta de ponteiras específicas para o trabalho de artesanato. Além disso, caso se opte por usá-lo, praticamente se inviabiliza para seu uso original com solda, pois vai acumulando plástico carbonizado que lentamente adere à ponta.
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Gotejador de cera — Esse nome estranho — em inglês, wax carver — é de um dispositivo bem conhecido dos odontologistas, usado para fazer moldes de cera para próteses dentárias. O que se ressalta dele no entanto é que tem características muito próximas às do Retouch3D, desde o formato das pontas intercambiáveis quanto a faixa de temperatura de trabalho (ainda que um pouco menor) e ainda o fato de usar metal que não "gruda" no plástico. Além disso, o gotejador com duas pontas independentes e temperatura regulável custa aproximadamente metade do preço do Retouch3D. É um substituto competente para a tarefa. O autor ilustra seu uso com um modelo chinês de gotejador adquirido por menos de 50 dólares: https://www.youtube.com/watch?v=4f4aPmjVoK4.
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Forno elétrico — esse item tão comum na cozinha é valioso para muitas tarefas relacionadas ao acabamento. Por exemplo, é útil para, quando usado em baixa temperatura, tirar a umidade de filamentos antes das impressões. E pode ser usado para amolecer as peças para remoldagem, para melhorar a superfície e fazer recozimento (annealing), que falaremos logo à frente. Para a impressão 3D o ideal é um forno elétrico de volume médio com regulação PID de temperatura. A resistência nunca deve tocar a peça. Deve também ser dedicado a esse uso, pois os vapores do plástico o impregnarão e deixarão impropício para uso alimentício. Além disso, existem as precauções de segurança necessárias como uso em ambiente isolado, arejado e protegido pois há perigo de incêndio e emissão de fumaça tóxica. A recomendação também serve apenas para fornos elétricos, não se estendendo a fornos de microondas que via de regra não são úteis para este fim.
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Ferramenta de metal aquecida — No iníco e na falta de verba para ferramentas mais adequadas, mesmo uma ferramenta com ponta de metal pode ser útil. Aquecendo-se a ponta de um pequeno canivete de cabo de madeira com algo que não use chama — por exemplo, tocando no ferro de solda ou usando a pistola de vapor — o metal fica acima da temperatura de derretimento do plástico, e pode ser usado por alguns segundos para reparar ou remover seções resistentes. De novo, as precauções com segurança são bastante necessárias aqui; uma ferramenta com cabo de metal se aquecerá por inteira e pode queimar a mão; uma ferramenta com cabo de plástico pode derretê-lo; colocar uma ponta de metal direto na chama causará oxidação no metal e pode inutilizá-lo.
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Morsa / Torno / Sargento — Ferramentas de fixação são necessárias para permitir que o acabamento seja feito na peça sem que ela escape, para imobilizá-la em posições diferentes, para colar partes em contato ou ainda para realizar pressão, como ao firmar um inserto de metal na peça de plástico. Há dois tipos principais que nos interessam, as morsas (ou tornos), que são instrumentos mais pesados que fixam estacionários em uma mesa ou apoio, e os sargentos, ferramentas portáteis que servem para fixação ou colagem na peça. No caso da morsa, caso se tenha pouco espaço de trabalho, é recomendada um morsa articulada de sucção que além de ter liberdades de posicionamento é uma ferramenta móvel — comparada à de bancada que geralmente é afixada com parafusos.
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Kit de assistentes de soldagem — apesar do nome ligado à eletrônica, essas ferramentas que consistem em extremidades de metal com formas diversas para criar alavancas, enganchar, mover, limpar, punçar e puxar elementos pequenos são ótimas para tratar detalhes minúsculos e partes difíceis de alcançar de peças de impressão 3D.
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Terceira mão — sendo um suporte mais delicado e sofisticado que uma morsa, é muito usado para soldagem, mas serve também para imobilizar e suportar peças pequenas rebuscadas para trabalhos complexos. Um kit que contenha lupa e iluminação é recomendado.
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Lupa — serve para trabalhar com detalhes pequenos, e existem modelos na forma de óculos ou monóculo que evitam ocupar as mãos, servindo para trabalhos em que se a use mais continuamente e não se queira usar a lupa da terceira mão.
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Pinças — existem pinças de todo tipo, com forma de tesoura a iluminadas, mas as de manicure já ajudam enormemente na remoção de fiapos e pequenos detalhes do interior das peças. Curvadas ou retas são igualmente úteis, mas uma que possa exercer maior força e pegada mais forte são preferíveis para o caso geral. As com ponta chata têm maior facilidade de capturar um fiapo de plástico que as pontiagudas.
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Tamboreamento — apesar de ser inviável citar todo e qualquer método industrial de acabamento existente, o tamboreamento (rock tumbler, em inglês) é um método útil para peças com geometria mais robusta e com efeito especialmente distinto nos materiais que contêm metal em pó, pois permitem ressaltar o brilho, reflexividade e textura metálica. O aparelho é simplesmente um pequeno "barrill" giratório em que se coloca a peça de interesse, um detergente especial e elementos abrasivos, como pedrinhas ou lascas. Depois de alguns minutos a poucas horas de giro, a abrasividade torna a peça reluzente e agradável. O youtuber "Barnacules Nerdgasm" fez um vídeo mostrando o processo e o antes e depois: https://www.youtube.com/watch?v=nDoYO22103Q. Existem aparelhos de tamboreamento assim como detergentes e grãos abrasivos com preços baixos em sites de artesanato e joalheria.
Acabamentos com contato mecânico com a peça, como o desbastamento, têm utilidade limitada. Funcionam bem em superfícies bem suportadas e definidas, mas uma das principais vantagens da impressão 3D em relação a outros processos de fabricação é a possibilidade de formas complexas; e formas complexas são feitas de seções finas, detalhadas e rebuscadas, com saliências e reentrâncias que ou não conseguem que as ferramentas de desbastamento alcancem, ou que se quebram com a tensão mecânica (lembrando que a FFF apresenta anisotropia que faz especialmente partes verticais finas serem frágeis). O tratamento térmico alivia um pouco esse problema por não necessariamente ter tensão mecânica, mas se não for muito bem controlado faz as seções delicadas desabarem — ou até a peça toda.
Por isso, um tipo de tratamento que começou como curiosidade, mas acabou virando ferramenta essencial para o trabalho de acabamento é o tratamento químico. A idéia geral de tratar o plástico ABS com o solvente acetona já era conhecida antes mesmo do movimento reprap, mas o tratamento mais popular, o uso de vapor aquecido atacando o plástico, parece ter vindo da mente dos reprappers Neil Underwood e Austin Wilson, documentada no blog de Austin1 em 2013. Na condensação do solvente na superfície, o líquido resultante escorre, selando as lacunas entre camadas e suavizando os contornos verticais da peça. Então a peça é retirada do banho de vapor de solvente, que acaba o processo de evaporação e deixa a peça resultante alisada e até brilhante. Pode parecer um procedimento "doméstico" e desajeitado, mas os anos provaram que está aí pra ficar e tem o uso ratificado pela prática, constando até de artigos científicos em usos biológicos.2
Existem vários jeitos de realizar a operação descrita, mas alguns pontos merecem destaque:
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Quase sempre, vale mais a pena usar o solvente na forma de vapor do que líquido. Na forma de líquido o contato exerce pressão mecânica maior e é muito mais agressivo, e por isso menos controlável. O solvente também tem chances maiores de interagir com aditivos e corantes do plástico nessa forma — por exemplo, a acetona em forma líquida comumente "desbota" o ABS tratado, enquanto na forma de vapor isso não ocorre — pelo contrário, a exposição ao vapor pode retornar a cor de uma peça por remover o aspecto esbranquiçado de arranhões. Alguns métodos de tratamento usam, ao invés do solvente puro, uma mistura do solvente com água para ter controle.
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Como o solvente deve ter também certa volatilidade, o tratamento com vapor frio pode ser uma opção, ainda que mais lento.
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O acabamento químico deixa a superfície "lisa" e vedada, e prejudica a adesão de tintas e revestimentos (que se beneficiam de microporos do material para entranharem e se firmarem).
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O solvente nunca escorre ou evapora completamente da peça, portanto o término do contato deve ser feito antes do ponto ideal de tratamento, para permitir que a peça "descanse" e chegue à forma final. Este tempo de descanso varia de acordo com a geometria da peça, o solvente e o método, podendo variar de horas a semanas. Nos primeiros minutos de contato a peça geralmente estará bem pegajosa e dependendo do solvente e da penetração, flexível, tendo que ser manuseada com extrema delicadeza para não aderir à ferramenta que a estiver suportando.
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É possível exagerar no tratamento da peça e ela terminar não somente pior que antes, com deformações, rachaduras e bolhas. É um incidente que acontece com frequência ao se tentar alisar completamente a peça, visto que o solvente continua agindo após a interrupção do banho. É preciso um pouco de treino até encontrar o ponto ideal de tratamento com o solvente específico, tanto em tempo quanto em quantidade.
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Devido ao ponto anterior, as ferramentas para manuseamento e apoio da peça devem ser finas para minimizar o contato e aderência, além de resistentes aos solventes. Peças de metal como pinças de fundição e pegadores de laboratório são adequadas para a manipulação e superfícies como uma malha de arame ou redinha metálica são adequadas para o apoio. Todos esses itens precisarão de limpeza após o tratamento, pois partículas do plástico dissolvido inevitavelmente aderem e se acumulam em suas superfícies.
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Especialmente se for feito o tratamento com vapor, proteção adequada é indispensável. Isso envolve não só proteções de corpo inteiro como luvas de nitrilo, macacão de proteção, proteção de cabelo, máscara de gás com filtro para solventes orgânicos, óculos e botas de borracha, mas também um ambiente adequado para a emissão de fluidos inflamáveis de forma contida, como uma capela química ou um contêiner de construção anti-chamas e resistente a solventes. Recomenda-se ainda um plano de emergência para acidentes, como uma fonte de água abundante com um chuveiro próximo ao local e um extintor de incêndio de CO₂, o mais apropriado para solventes inflamáveis.
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Se usado o método do vapor por aquecimento de líquido, e o recipiente não for completamente vedado, a fonte de calor não pode ter chama ou elemento incandescente exposto, pois o contato com o vapor pode causar incêndio ou explosões. A acetona, por exemplo, tem vapor invisível e mais pesado que o ar; aquecida por baixo estando contida em um recipiente, sobe até a borda e "entorna" pelos lados, alcançando o elemento aquecedor. Em teste feito pelo autor numa capela química com 50ml de acetona em uma lata e uma vela abaixo para aquecê-la, o tempo desde o acendimento da chama da vela até o conjunto se incendiar foram meros 12 segundos, e as chamas permaneceram por 6 minutos. Nem todos os solventes são facilmente inflamáveis como a acetona, mas a precaução é recomendada sempre. Fogões/fogareiros elétricos com superfície não-incandescente são baratos e suficientes para o caso geral.
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Exceto no caso da solução de limpeza e thinner, todos os solventes aqui listados necessitam de permissão da polícia federal para compra, embora o limite varie (por exemplo, 2l por mês para acetona e 5l por mês para tetraidrofurano). Comprando em locais devidamente autorizados como lojas de laboratório, o procedimento costuma ser simples e na hora por eles facilitarem. Desconfie de vendas pela internet em sites como mercadolivre, pois além do risco de estar cometendo um ato ilegal, não existe garantia de procedência.
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Segue a legislação de interesse sobre tais produtos. Cabe notar que isto não deve ser encarado como aconselhamento legal e sim uma orientação inicial, devendo o leitor realizar sua própria pesquisa ou contratar um advogado caso ache necessário:
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Portaria n. 1.274 de 25 de agosto de 2003 — explica a razão pela quais os produtos químicos abordados são controlados e as provisões para sua comercialização e aquisição. Disponível na integra na página da Polícia Federal em http://www.pf.gov.br/servicos-pf/produtos-quimicos/legislacao/PORTARIA1274.pdf/view.
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Anexos da Portaria 1.274/03 — material de suporte da Portaria 1.274, com o mais importante para nossos propósitos sendo o Anexo I, que lista os materiais cuja comercialização e aquisição são controlados e seus respectivos limites. Disponíveis em http://www.pf.gov.br/servicos-pf/produtos-quimicos/legislacao/anexos-da-portaria-1274-03.
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Lei n. 10.357, de 27 de dezembro de 2001 — Estabelece normas de controle e fiscalização de produtos químicos que direta ou indiretamente possam ser destinados à elaboração ilícita de substâncias entorpecentes, psicotrópicas ou que determinem dependência física ou psíquica, e dá outras providências.
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Adicionalmente, um guia online que facilita o acesso à informação da portaria 1274/03 encontra-se neste endereço: http://www.dinamicadespachante.com.br/materias.php?cd_secao=56.
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Com todos os pontos esclarecidos, o melhor modo de explicarmos de forma efetiva é primeiro listar os diferentes solventes e suas particularidades para então descrever os métodos de alisamento.
Note
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Notas:
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O solvente mais utilizado e documentado de todos é, sem dúvida nenhuma, a acetona, também chamada de propanona ou dimetil cetona. É o composto da classe das cetonas mais simples, na forma de um líquido incolor de odor característico e frutado. É massivamente produzida pela indústria para uma enorme variedade de cenários, desde reação para criação de outros produtos químicos até para inclusão em produtos como removedor de esmalte e thinners de tinta. Sendo um composto produzido pelo próprio organismo e tendo via metabólica de eliminação, sua capacidade tóxica é baixa, tendo toxicidade aguda e crônica baixas se ingerida ou inalada. Não há estudos que lhe atribuam efeitos carcinogênico, mutagênico ou neurotóxico. É até mesmo usada em baixa quantidade em alguns alimentos e bebidas, por ser "geralmente reconhecida como segura". Por outro lado, o contato da acetona com a pele dissolve os óleos de proteção naturais e a resseca1.
Tem densidade de 0,7845 g/cm3 (~80% da da água) e ponto de ebulição em 56°C, sendo no entanto bastante volátil mesmo abaixo dessa temperatura — uma de suas propriedades mais utilizadas. Na forma de gás, tem densidade duas vezes maior que o ar, tendendo a se acumular em cima do líquido ao invés de se dispersar. O ponto de fulgor da acetona é de -20°C e o composto é bastante inflamável, o que quer dizer que acima dessa temperatura a acetona entra em combustão com qualquer chama, o que a torna bastante perigosa. Apesar disso, para entrar em combustão sem chama inicial ("ponto de auto-ignição"), é necessário aquecê-la a 465°C. É miscível em água e álcool. Na atmosfera em forma de gás, tem meia-vida até degradação por ultravioleta de 22 dias.
A acetona é um composto controlado pela portaria 1.274/03 com limite de 2l por mês, sendo obtida em locais especializados como lojas de laboratório, que facilitam o processo de permissão pela polícia federal. Por isso mesmo, compostos derivados de acetona de acesso livre como removedores de esmalte a têm em baixa quantidade e em conjunto com outros compostos que contra-atacam alguns de seus efeitos. Por essa razão, a acetona a ser usada nas tarefas de acabamento deve obrigatoriamente ser a de laboratório, com pelo menos 99% de pureza (denominada P.A. de "pureza analítica" ou "para análise"); uso da "acetona de farmácia" ao invés da de laboratório quase sempre resultará em um acabamento malfeito e ação conjunta dos outros componentes da solução na peça, levando a rachaduras, descoloramento, bolhas e fragmentação, muitas dessas ações aparecendo somente dias depois do tratamento.
A acetona funciona bem com filamentos de ABS, ASA e policarbonato; em termos químicos, diz-se que é "incompatível" com o material pois o dissolve. Logo, um material resistente à acetona será "compatível" com ela. A acetona é um composto bastante polar: os polímeros mais compatíveis com a acetona são os que têm baixa polaridade, como o polietileno; os mais incompatíveis, ou seja, que se dissolvem melhor, terão polaridade alta, próxima à da própria acetona — como nitrocelulose e poliestireno.
A acetona funciona com PLA? É uma pergunta extensivamente repetida em fóruns de internet. Deveria ser outra: a acetona dissolve o PLA? E para essa pergunta a resposta é "não". No entanto, há centenas de testemunhos e muitos vídeos de pessoas persistentemente tratando peças de PLA com acetona e tendo resultados. Isso ocorre porque certamente a acetona ataca o PLA, de maneiras diversas, desde o ressecando até contribuindo para oxidação e degradação. Para tornar a situação mais complicada, a formulação do PLA tem muitas variáveis e vários de seus aditivos são dissolvidos pela acetona, ou dão um efeito visualmente agradável quando atacados por ela. Portanto, a forma como a acetona age com o PLA usado dependerá de muitos fatores pertinentes ao filamento específico. Um revés muito grande, entretanto, é que na maioria desses casos, a ação de alisamento aparente mostra seus problemas a médio ou longo prazo, com o aparecimento de fissuras, rachaduras, desbotamentos e fragmentação da peça.
Vantagens:
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Alta disponibilidade em lojas de laboratório.
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Baixo preço.
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Bastante volátil, o que faz com que a peça seque rapidamente após a aplicação.
Desvantagens:
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Necessidade de permissão da polícia federal e limite de 2l por mês.
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Inflamável.
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Não raramente interage com corantes do plástico e os "desbota".
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Levemente tóxica.
Note
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Notas:
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Pânico! Horror! Indignação! A substância mais conhecida do público leigo pelo "lança-perfume"1 ou pelo clichê hollywoodiano de ser embebida em um pano e colocada no rosto de uma vítima para incapacitá-la não merece a fama que tem, a começar pelo clichê ser falso (administrado desse modo, ele levaria pelo menos cinco minutos para agir). No "mundo real", o clorofórmio ou triclorometano, de fórmula CHCl₃, é, como a acetona, produzido industrialmente em larga escala e entra no processo produtivo como precursor de várias substâncias (como o PTFE, ou Teflon) e solventes de tantas outras, como gorduras, óleos, borracha, alcalóides, ceras e resinas. Também aparece por processos naturais, especiamente sintetizado por algumas algas e fungos.
Muito de sua toxicidade vem de ser um composto organoclorado2, sendo reativo e carcinogênico. Apesar disso, é bem absorvido, metabolizado e eliminado por mamíferos após exposição oral ou dérmica, podendo criar feridas por dissolver os lipídios da epiderme. A eliminação é primariamente pelos pulmões. O clorofórmio é um depressor do sistema nervoso central, podendo causar torpor e coma, com sintomas sérios com a ingestão de 7,5g do material e a dose letal sendo estimada em meros 45g.
É, como a acetona, um líquido incolor e com odor característico — e devido à sua toxicidade, sentir este odor já é um indicativo alarmante de exposição excessiva. Não custa reiterar, a proteção adequada ao manuseá-lo é questão de vida ou morte. A peça deve ser tratada em ambiente isolado, preferencialmente em capela química, e com todo o aparato de proteção de corpo inteiro. Diferente da acetona, tem densidade maior que a água e, apesar de também ser volátil, é bem menos, significando que peças tratadas com ele demorarão mais para secar. Tem ponto de ebulição ligeiramente maior que a acetona — 61°C — e a vantagem de não ser inflamável, se decompondo em 450°C. Não é solúvel em água, pois não tem grupos hidrofílicos.
Assim como a acetona, tem sua compra controlada pela portaria 1.274/03 com limite de dois litros por mês. Tem o preço próximo ao da acetona. Funciona especialmente bem com PLA, mas sua utilidade se estende para muitos dos outros filamentos, incluindo ABS, ASA e policarbonato, com o efeito em PETG e TPU dependendo do filamento específico. A ação de dissolução do PLA é intensa e rápida, então o tempo de exposição da peça não deve passar de poucos minutos. Aliado à menor volatilidade, há maior propensão em tratar a peça "além do ponto" com clorofórmio do que com acetona. Por outro lado, mesmo com o tratamento em forma líquida, o clorofórmio não costuma interagir com os corantes dos filamentos, preservando sua cor.
Vantagens:
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Alta disponibilidade em lojas de laboratório.
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Baixo preço.
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Moderadamente volátil, a peça não demora muito para secar.
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Consegue tratar vários plásticos diferentes.
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Ação forte e rápida, alguns segundos podem ser suficientes de acordo com a peça.
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Não é inflamável.
Desvantagens:
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É a substância mais tóxica da lista. É carcinogênica, depressora do sistema nervoso central e exige proteção de corpo inteiro com máscara de gás para manipulação.
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Necessidade de permissão da polícia federal e limite de 2l por mês.
Note
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Notas:
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Se o clorofórmio é triclorometano, CHCl₃, o diclorometano ou cloreto de metileno é o "irmão menor", com apenas dois átomos de cloro — CH₂Cl₂. Aparece na mesma Lista II de substâncias controladas da portaria 1.274/03 que o clorofórmio, com o mesmo limite. Em geral, o diclorometano tem propriedades próximas às do clorofórmio, sendo mais volátil, tendo temperatura de ebulição em 39,6°C e temperatura de auto-ignição em 556°C, mas podendo formar misturas combustíveis quando acima de 100°C. É o menos tóxico dos cloroidrocarbonos, mas sua alta volatilidade torna a inalação e absorção dérmica bastante perigosa. Tem odor semelhante ao clorofórmio, sendo facilmente reconhecível, e exige as mesmas proteções para manipulação. Sua ação de solvente afeta os mesmos plásticos que o clorofórmio afeta mas é mais lenta, portanto pode ser preferível para se ter maior controle. O preço é um pouco maior que o clorofórmio por ser produzido em menor escala.
Vantagens:
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Boa disponibilidade em lojas de laboratório.
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Preço mediano.
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Bem volátil, a peça não demora para secar.
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Trata os mesmos plásticos do clorofórmio.
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Ação mais lenta e contida que o clorofórmio, podendo ser usado com maior controle.
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Menos tóxico que o clorofórmio.
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Não é inflamável nas temperaturas convencionais de aplicação com vapor (<100°C) e tem ponto de auto-ignição bem alto.
Desvantagens:
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Preço maior e disponibilidade menor que o clorofórmio.
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Mesma necessidade de proteção do clorofórmio.
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Necessidade de permissão da Polícia Federal e limite de 2l por mês.
O Tetraidrofurano (às vezes escrito — incorretamente - "tetrahidrofurano"), THF ou oxolano1 é um éter heterocíclico incolor, com odor pungente e forte ação solvente, atacado PLA, ABS, ASA, policarbonato e até látex, devendo ser manuseado com luvas de nitrilo. Devido a ser fracamente polar, pode dissolver tanto compostos polares quanto apolares e é miscível em água. Tem a toxicidade semelhante à da acetona, isto é, baixa, mas devido à sua forte ação solvente o risco de penetração dérmica e consequente desidratação é maior. Além disso, com ponto de fulgor em -14°C, o tetraidrofurano é altamente inflamável e tende a formar peróxidos explosivos. Tem temperatura de ebulição de 66°C e no estado de vapor é 2,5 vezes mais pesado que o ar, oferecendo o mesmo perigo da acetona de o vapor inflamável "entornar" de um recipiente aberto e entrar em ignição em contato com peça incandescente — portanto é estritamente necessário manusear em ambiente que possa conter eventuais chamas e explosões. Algumas formulações de tetraidrofurano misturam o inibidor de peróxidos hidroxitolueno butilado (BHT).
Seu maior revés no entanto é o preço. Custa em média 3 vezes mais que a acetona. Por outro lado tem limite de utilização bem maior, de 5 litros por mês. Apesar de ser um solvente poderoso, sua ação no PLA é mais lenta que do clorofórmio.
Vantagens:
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Relativa baixa toxicidade, semelhante à da acetona. Seu odor pungente e forte também torna vazamentos facilmente perceptíveis, bem mais que as outras substâncias.
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Poder solvente mais lento que do clorofórmio, permitindo maior controle.
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Limite de 5l por mês, bem maior que das outras substâncias controladas.
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Trata uma gama variada de plásticos, semelhante ao clorofórmio e diclorometano.
Desvantagens:
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Preço consideravelmente maior, cerca de 3 vezes o preço da acetona ou até mais.
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Necessidade de permissão da Polícia Federal.
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Apesar da mesma toxicidade, riscos maiores que o da acetona, em especial de penetração dérmica ou ignição de chamas ou até explosão. Devido a esses riscos, a necessidade de um ambiente com contenção de chamas é indispensável.
Note
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Notas:
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Se o clorofórmio tem seu irmão mais fraco, o diclorometano, pode-se dizer que a acetona tem uma irmã mais forte, visto pela sua enorme polaridade de 2,76D, a metil-etil-cetona, MEK (do inglês methyl ethyl ketone) ou butanona. É um solvente industrial largamente usado e pode ser visto como uma acetona com ação solvente mais rápida e forte, funcionando com os mesmos plásticos, e volatilidade bem menor. A temperatura de ebulição da MEK é 79,6°C; isso quer dizer que caso se aqueça a mistura, seu vapor estará nessa temperatura ou acima, e além da ação de dissolução do plástico, no caso dos plásticos resistentes como o PLA pode haver amolecimento pela temperatura acima da transição vítrea. Esse efeito pode ser facilmente confundido com o alisamento da peça, mas será na verdade degradação que acaba levando a rachaduras e inviabilização.
A MEK tem os mesmos requerimentos de aquisição da acetona, com limite de 2l por mês e um preço um pouco maior. Tem também os mesmos riscos e embora seja menos volátil, é mais tóxica, e ainda é inflamável e até explosiva.
Vantagens:
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Alta disponibilidade em lojas de laboratório.
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Preço baixo a mediano.
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Baixa volatilidade, o que permite maior controle.
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Ação mais forte e rápida
Desvantagens:
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Preço maior que a acetona.
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Necesside de permissão da Polícia Federal e limite de 2l por mês.
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Ação mais forte e rápida pode degradar a peça.
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Baixa volatilidade fará com que os métodos a frio não funcionem bem.
Acetona e MEK são produtos extremamente necessários em alguns campos de trabalho — solventes que podem ser usados para todo tipo de preparado e limpeza - e a burocracia e taxas extras para obter tais produtos seriam paralisantes. Felizmente, existem produtos industrializados, de preços próximos ao desses solventes, que os utilizam em sua formulação sem impurezas que impeçam sua ação, e que podem ser obtidos sem permissões especiais, precisando apenas o comprador ser maior de 18 anos. Desses produtos, o mais importante é a assim chamada solução preparadora ou solução limpadora de canos e PVC, uma mistura primariamente de acetona e MEK. Discriminamos três marcas principais fáceis de encontrar no mercado brasileiro: Tigre, Pulvitec e Amanco.
As três soluções têm uma porcentagem de MEK e acetona variável, mas dentre esses limites:
Solução |
% de Acetona |
% de MEK |
Tigre |
22-70 |
30-861 |
Polytubes |
60-100 |
1-202 |
Amanco |
40-50 |
40-503 |
Vantagens:
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Alta disponibilidade e facilidade de compra: em lojas de encanamento, materiais de construção e pela internet.
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Não necessita de permissão da polícia federal, apenas ser maior de 18 anos.
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Preço semelhante ao de frascos de acetona e metil-etil-cetona.
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Mistura dos dois solventes, se valendo tanto da força maior da MEK quanto da volatilidade da acetona.
Desvantagens:
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Só funciona com os mesmos plásticos da acetona e metil-etil-cetona.
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Tem os mesmos perigos e riscos dos dois solventes.
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Pode ser difícil achar os frascos maiores de 1l, visto que os de 200ml também são vendidos.
Note
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Notas:
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Assim como passamos uma lista de compostos que podem ser usados para o acabamento químico, há também aqueles compostos que, embora disponíveis no mercado e anedoticamente utilizados para esse fim, são inadequados ou até perigosos. Apresentamos uma pequena lista de compostos que o leitor deve evitar usar.
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Acetona de farmácia ("removedor de esmaltes"): devido à sua composição com álcool, água e outras substâncias que além de inibir o efeito solvente da acetona têm grande potencial de degradar a peça, seu uso é totalmente desencorajado.
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Thinner: Thinner, ou "diluente" em português, é um composto que serve para diminuir a concentração já existente de um composto em uma solução — diluindo o composto. Contraste com solvente, que é o composto que vai criar a solução, dissolvendo ou solubilizando algo em si. Já notamos então estarmos trabalhando com uma categoria de produtos, e não um produto específico, o que complica a situação. Thinners são geralmente usados para tintas de diversos tipos, com várias fórmulas diferentes, mas um padrão pode ser observado que é a mistura de hidrocarbonetos aromáticos, ésteres, glicóis, álcoois e cetonas, alguns desses produtos com ações destrutivas aos plásticos. A legislação não exige que a composição exata do thinner seja especificada, então é muito difícil dizer a adequação de uma marca particular para o objetivo de fazer acabamento em plásticos e praticamente impossível de comparar com outras substâncias.
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Acetato de etila: um solvente relativamente barato e encontrável em lojas de laboratório com momento de dipolo de 1,78D, não necessitando de permissão especial para compra. geralmente recomendado para uso com o PLA mas diferentemente do que se diz sobre ele, não funcionando se o polímero for enantiopuro1 (tiver um único isômero no material — que é geralmente o caso), tendo infelizmente ação reduzida sobre a superfície da maioria das formulações desse polímero. Na prática, vê-se que a baixa ação dele em peças de PLA não justifica seu uso, e dado que seu ponto de ebulição é alto — 77,1°C — pode ser que haja confusão entre os que o advogam entre o tratamento por calor e o efeito de dissolução da superfície.
Note
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Notas:
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Listados os materiais de que podemos dispôr e suas particularidades, o passo seguinte é enumerar os métodos que usaremos com eles. Começamos pelo mais básico e aumentamos a sofisticação, além de dizer as vantagens e desvantagens de cada um.
O método mais simples possível de tratar uma peça fabricada por uma impressora 3D FFF é submergi-la no solvente, e as desvantagens são óbvias para qualquer um que já mergulhou um cubo de açúcar ou um cristal de sal em água, que é solvente para esses compostos: a deformação e destruição são imediatas, e embora a ação dos solventes de plásticos seja mais suave, o procedimento para dar certo tem tantas variáveis e necessitaria de tanto controle que não é usável na prática. Entre outros fatores, a convecção do líquido causará deformação, e em alguns líquidos mais densos que o plástico, como clorofórmio, a flutuabilidade da peça tanto causa deformações quanto atrapalha a submersão. O solvente também penetra rapidamente nos interstícios de camadas e encharca a peça por dentro, e quando essa é removida, a geometria pode criar poças localizadas que continuarão atacando a forma. Outro problema é que o custo de tais solventes em volume suficiente pra permitir submersão é alto e ainda esbarra no limite mensal das regulações, e o líquido torna-se inutilizável após pouco uso, por acumular corantes de plásticos que contaminarão os seguintes.
Em especial a submersão em acetona tem o frequente inconveniente de agir nos corantes e desbotar o plástico.
De qualquer modo, existem ocasiões para as quais esse método pode compensar, como tratamento rápido de uma peça pequena. Nesse caso, deve-se lembrar de usar as proteções adequadas e submergir a peça bem antes do ponto ideal pois a ação do solvente continuará forte mesmo depois de retirada. É preciso ter bastante cuidado com os instrumentos e ambiente de secagem pois a peça estará pegajosa e amolecida e qualquer contato inadvertido a deformará.
Vantagens:
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Método mais simples. Exige apenas o recipiente com o solvente, a peça, um instrumento para fazer a submersão e as proteções.
Desvantagens:
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Para conseguir resultados razoáveis em todas as situações, exige muito controle, incluindo potencial custo em equipamentos e instrumentos com esse fim.
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Utiliza uma grande quantidade de solvente, o que além de dispendioso torna seu uso crítico visto que têm limites mensais regulados pela lei.
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Lida com pressões mecânicas de convecção e efeitos de flutuação que podem distorcer a peça.
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Em muitos casos atinge os corantes e "desbota" a peça.
Um dos meios de atacar alguns dos pontos do método anterior é diluir o solvente que usaremos em algum outro líquido inerte para o plástico cuja disponibilidade seja abundante e custo pequeno — o melhor candidato sendo, para a maioria dos casos, a água comum — de torneira ou destilada. Com isso, é possível reduzir o custo, já que se usa menos solvente — e de quebra o limite mensal passa a ser menos preocupante — e também se obtém maior controle, visto que a mistura agirá mais lentamente que o solvente puro. Lembrando que o método não funciona com solventes imiscíveis em água, como o clorofórmio e diclorometano, a afirmação de que a água é inerte para o plástico, ainda mais quando este se encontra sendo atacado pelo solvente, é contestável — aqui, a hidrofilia do material terá um efeito considerável e pode causar degradação polimérica, tendo que ser feitos testes caso a caso para se avaliar a adequação ao material.
Vantagens:
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Método simples
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Diminui o custo e limites da imersão, diluindo o solvente em água
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Maior controle, por ter ação mais lenta.
Desvantagens:
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Necessita de testes caso a caso, pois a água pode degradar o material.
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Lida com pressões mecânicas de convecção e efeitos de flutuação.
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Precisa que o solvente seja miscível com água, descartando clorofórmio e diclorometano.
Um caso ligeiramente diferente ocorre quando se quer tratar apenas partes ou seções mais grosseiras da peça, ou ainda se deseja usar o solvente como "cola" de duas partes do mesmo plástico, ou mesmo se deseja abdicar da rapidez do tratamento por inteiro em razão de um mais artístico e artesanal usando um aplicador do líquido — que pode ser um pincel, uma pequena seringa ou até uma "caneta especializada" para aplicações. É importante fazer uns testes com o solvente e o plástico que se deseja tratar antes de partir para uma peça final, pois os efeitos podem ser destrutivos para a peça e o pincel. Em especial, a acetona tende a desbotar o ABS quando aplicada diretamente na superfície em forma líquida; outros solventes podem ter efeito semelhante, ou ainda tornar o plástico tão pegajoso que seja inviável o contato do pincel. Um jeito de evitar que a acetona desbote a peça com a aplicação é esquentar a peça antes em forno em temperatura média (60°C) e depois do tratamento com pincel, novamente colocá-la no forno.
Como existem vários aplicadores diferentes, comentamos apenas os mais populares:
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Pincéis. No caso da aplicação do solvente com pincéis, é importante usar pincel chato ou pincel trincha, preferencialmente de cerdas naturais porque elas são naturalmente mais resistentes a solventes. É sempre necessário limpar o pincel no fim da aplicação com thinner ou mais do próprio solvente pois o plástico residual que adere às cerdas, quando o solvente seca, tende a se acumular e inutilizar o pincel, quebrando cerdas ou formando uma camada grossa em volta. Mas mesmo a limpeza metódica não garante sobrevida muito maior ao pincel: este deve ser visto como um item consumível e renovável, visto que após um número variável de aplicações começa a deteriorar e até perder cerdas — que podem grudar na peça, a arruinando. Nesse caso, então, pode ser preferível priorizar pincéis de baixo preço em detrimento dos mais sofisticados.
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Seringa / pipeta / mini-borrifador. Método geralmente usado para trabalhos mais esporádicos, consiste em gotejar ou borrifar em baixo volume e de forma controlada seções da peça com o líquido solvente para atuação local. Haja visto que não se toca a peça com o aplicador, é um método que depende inteiramente de o líquido agir com o efeito e intensidade desejados, o que nem sempre acontece. Pode ser feito de forma econômica comprando seringas de farmácia (que são de polipropileno e, portanto, resistente aos solventes aqui mencionados) e removendo a agulha. Caso um borrifador seja usado, é importante verificar que seja de material resistente ao solvente usado.
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Caneta aplicadora. Esta é uma nova opção que surgiu em financiamento coletivo e independentemente em certas lojas de impressão 3D: um dispositivo feito de plástico resistente a solventes (geralmente polipropileno) e com uma ponta esponjosa retrátil que quando pressionada se encharca com o solvente do compartimento. O único pequeno inconveniente é que a pressão para a ponta se retrair pode prejudicar o tratamento delicado de seções finas, mas fora isso é uma ótima ferramenta para corrigir imperfeições locais de superfície e como tem resposta táctil com a ponta retrátil, inspira considerável melhoria da habilidade de tratamento com a prática. Ainda que não seja um instrumento caro, no entanto, não se encontra pra vender no Brasil e é necessário importá-lo. Uma alternativa barata e artesanal é apresentada no canal de youtube do autor.
Vantagens:
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Permite tratamento localizado de imperfeições.
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Talento nessa forma de artesanato vai pesar bastante na forma final da aplicação.
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É útil para outros usos, como colar peças do mesmo plástico.
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Utiliza pouco solvente — somente o essencial para umedecer a superfície com o aplicador.
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Baixa exposição ao solvente, resultando em baixo risco.
Desvantagens:
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Dependendo da combinação de aplicador, solvente e plástico, pode desbotar a coloração (evitável com aquecimento).
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Se forem usados pincéis, eles terão vida curta e necessitarão ser constantemente trocados.
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Com seringas e borrifadores, o solvente aplicado pode não ter o efeito desejado.
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Depende de o aplicador alcançar a parte da peça que precisa de tratamento; em formas complexas, isso pode ser impossível.
A encarnação mais comum deste método é o uso de uma lata média ou grande com papel absorvente preso nas paredes internas por pequenos ímãs, ou recipiente de vidro com espuma colada nas paredes. Embebe-se o papel absorvente ou a espuma com o solvente e apoiando-se a peça de plástico em uma base não-aderente ou resistente a solventes como papel alumínio, coloca-se o recipiente em cima, vedando o conjunto. A volatilidade natural do solvente fará com que o ar dentro do recipiente fique saturado com ele, e vá tratando lentamente a peça. Um tratamento desses tipicamente leva no mínimo meia hora e funciona melhor com os solventes mais voláteis, como acetona e tetraidrofurano, sendo consideravelmente mais lento quando usado com MEK, clorofórmio ou solução preparadora.
Vantagens:
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Não agride nem tende a deformar muito a peça, preservando os contornos e atacando só a superfície.
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É um método lento, permitindo por isso maior controle.
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Não envolve aquecimento ou fonte de energia, oferecendo por isso menos riscos.
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Utiliza pouco solvente — somente o essencial para embeber o papel ou espuma.
Desvantagens:
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Como a lata é opaca e mesmo o vidro tem que ser revestido internamente por espuma, a peça não é visível durante o tratamento, e o método não permite boa averiguação do progresso. Levantamento do recipiente para averiguação da peça faz o vapor frio escapar, prejudicando o tratamento.
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O tempo de tratamento demorado pode ser um revés.
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O vapor frio, especialmente para os solventes de PLA, normalmente não é tão efetivo quanto o aquecido.
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Como há certo contato com o líquido e ainda o vapor no ambiente, é necessário o uso das proteções adequadas.
Como dito no histórico de tratamento de peças, esse foi o método que marcou uma mudança efetiva no fluxo de trabalho de acabamento. Seus resultados são os melhores de todos os métodos aqui descritos, com preservação e até ressalte das cores do plástico, manutenção da forma e contornos da peça e suavização rápida e elegante da superfície. É claro que isso não quer dizer que o método seja infalível — sua velocidade, por exemplo, também faz com que seja bastante agressivo, e há o risco de se exceder o tempo de exposição fazendo a peça deformar, criar bolhas e rachaduras, ou até mesmo parecer bem tratada a princípio e dias depois começar a deteriorar. Além disso, os perigos do contato com o líquido e o vapor aquecido são mais presentes nesse método, sendo indispensável o uso das proteções para corpo inteiro e sua execução em um ambiente isolado e protegido contra chamas, com uma fonte de calor sem partes incandescentes. Recomenda-se uma capela química com exaustor para máxima segurança.
Procedimento sugerido:
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Antes de iniciar o tratamento químico, a peça deve ter seus suportes e raft removidos, ter os defeitos de impressão mais aparentes removidos e principalmente a superfície lixada nas partes que deverão ficar mais lisas. A peça não deve estar úmida.
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Durante o tratamento, os fiapos menores serão completamente dissolvidos pelo vapor e o pó do lixamento e a superfície esbranquiçada do processo serão também atacados de forma a tomar um contorno liso e brilhante.
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Veste-se a proteção adequada, incluindo a máscara de gás com filtro para vapores orgânicos, o jalevo e as luvas de nitrilo.
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Coloca-se o fogareiro elétrico dentro do ambiente protegido e ventilado e se assenta o recipiente de tratamento, como um béquer, acima de sua espiral aquecedora.
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Ao invés do fogareiro elétrico, para testar o método pode-se usar a mesa aquecida da impressora regulada para uns 100°C, mas atente-se ao leitor que a mesa tem fios relativamente expostos e risco maior de faíscas, incêndios e explosão. O vapor de solvente escapando do recipiente também pode acabar agindo nas peças da impressora, especialmente acrílico que dissolve facilmente. Em operações do dia-a-dia, é desejável separar o ambiente de acabamento do ambiente de impressão.
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Coloca-se uma base para que a peça não entre em contato com o líquido (caso contrário ela sofrerá deformação quase imediata), e que tenha pequena área de contato, como uma rede metálica.
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Derrama-se um pouco de solvente no recipiente — geralmente 1 a 2mm de nível de líquido são suficientes para durar por uns 5 minutos — e por fim se coloca a peça.
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Pode-se colocar algo no recipiente para dificultar a saída do vapor, como uma tampa ou uma cobertura de papel alumínio, tomando o cuidado de não ser algo que o vede pois a pressão interna tende a aumentar com o aquecimento. * Liga-se o fogareiro elétrico na temperatura baixa. Esse ajuste deixa a espiral aquecida entre 80° e 120°C dependendo do modelo, e essa temperatura determinará a velocidade de evaporação. Lembrando a física básica, durante o processo de transição de fase (líquido para gasoso), a substância permanece na mesma temperatura, que é sua temperatura de ebulição.
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O tempo de exposição ótimo depende de quão lisa se deseja que a peça torne, da temperatura do fogareiro, do solvente e do tamanho, geralmente sendo de alguns segundos a *poucos minutos a partir do momento em que o líquido começa a borbulhar.
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Uma melhor qualidade é obtida expondo a peça ao vapor mais de uma vez com intervalos em que descansa em ambiente seco. Assim, o plástico dissolvido tem tempo de se acomodar no contorno da peça. Isso também ajuda a evitar superexposição. Claro, isso gera um novo problema: o vapor não vai "esperar" a peça secar pra se dissipar e submetê-la a várias passadas pode ser um desperdício. Um jeito de amenizar esse problema, otimizando a utilização do solvente evaporado, é aguardar a impressão de uma certa quantidade de peças para tratá-las em lote, e deixá-las algumas horas secando para as passadas subsequentes.
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Uma alternativa a deixar a peça dentro do béquer desde o início é usar um instrumento dedicado de pequena superfície de contato, como um pegador de laboratório, ligar o fogareiro e expor a peça pelo tempo suficiente para tratamento dentro do béquer. Esse método permite uma suavização personalizada e é especialmente recomendado pra peças altas, visto que o vapor tende a se acumular e ter ação muito maior na parte inferior do béquer. No entanto o risco de o plástico aderir no pegador é alto e a manipulação direta da peça envolve mais contato com o vapor aquecido e risco bem maior.
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Antes de chegar ao ponto desejado, desliga-se o fogareiro e se aguarda que o líquido pare de borbulhar. Pode-se esperar que o vapor se dissipe completamente ou se retirar a peça do béquer com instrumentos adequados e luvas para deixar secar em uma superfície adequada.
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Uma boa superfície para a peça secar é papel alumínio amassado de forma que suas rugas façam com que a peça tenha contato mínimo. Assim, o efeito de aderência do plástico amolecido será minimizado. Durante a secagem, a peça deve ficar longe de poeira ou resíduos, pois esses tendem a aderir facilmente à sua superfície.
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O béquer, base e pegador e quaisquer outros itens com contato com o vapor devem ser limpos depois do procedimento, pois tenderão a acumular plástico dissolvido e outros resíduos.
Vantagens:
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O método remove pequenos fiapos, respeita o contorno da peça e dá um acabamento brilhante e alisado.
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É um método rápido, podendo ser usado em lote para várias peças passando cada uma por apenas segundos no vapor quente do solvente.
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Vê-se claramente a superfície do plástico mudando, o que permite parar quando se acerta o ponto.
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Utiliza pouco solvente.
Desvantagens:
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Pode deformar ou prejudicar a peça se for usado por tempo demasiado.
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A superfície brilhante não é evitável. Se o desejado for uma superfície fosca ou texturizada, o banho de vapor aquecido não é o melhor método.
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Tem maiores riscos por envolver fonte de calor e vapores aquecidos (que se expandem mais rapidamente e sendo mais pesados que o ar, podem circundar o recipiente e "derramar" dele). Usar as proteções é indispensável.
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Deixa a peça flexível e pegajosa por alguns minutos. É preciso ter cuidado com o contato com ela para não arruinar sua superfície, e mesmo na hora da secagem é preciso deixá-la em lugar sem poeira e resíduos.
Uma idéia que necessariamente passa pela mente de muita gente é: o procedimento de aplicação de solvente é caro, desajeitado, perigoso e relativamente sem muito controle. Ao mesmo tempo, existem várias máquinas de consumo doméstico, como nebulizadores, vaporizadores e umedecedores cujo custo é baixo por serem do "mercado de massa" e que poderiam, com algumas modificações, ser facilmente usadas para realizar o processo de alisamento com menos risco e mais controle; seria uma exaptação do dispositivo para a impressão 3D. Maior espírito Maker que tentar isso, impossível! Alternativamente, ao invés de se obter uma máquina já pronta para modificar, pode ser mais eficaz aplicar os princípios de uma com elementos obtidos individualmente, como elementos nebulizadores e bombas de ar — também perfeitamente factível.
Ao se tentar tal empreitada, entretanto, as dificuldades logísticas e técnicas logo aparecem. Os pontos a se observar são:
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Os aparelhos de mercado são feitos de plástico e estamos procurando construir algo pra lidar com solventes de plástico. Percebe o conflito? Como acontece no mercado de massa por desinteresse dos consumidores, geralmente o plástico de que é feito a máquina nem mesmo é discriminado. Se for polipropileno, indicado em alguns modelos da marca Mondial por exemplo, o risco é menor, mas ainda assim presente, pois não há garantia que as outras partes, especialmente as elétricas, serão tolerantes e se comportarão como o desejado com o solvente.
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Os aparelhos de mercado não são construídos pra tratar objetos e por isso não têm câmara vedada e espaçosa como seria desejável, sendo construídas para dissipar o vapor no caso dos vaporizadores e umidificadores, e direcioná-lo no caso dos nebulizadores. O que isso significa é que mesmo que o aparelho seja usável para o propósito de acabamento, terá que sofrer consideráveis modificações estruturais.
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Nebulizadores, umidificadores e grande parte dos vaporizadores usam o método ultrassônico para dispersar as moléculas do líquido, o que gera um vapor frio que pode não ser o que queremos, já que o vapor aquecido tem efetividade tão maior no acabamento. Por outro lado, o fato de usar ultrassom ao invés de aquecimento torna o método mais seguro.
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Listados todos os motivos anteriores, os testes necessários, possíveis perdas ou acidentes, o mais seguro seria buscar informações de makers que já trilharam esse caminho e modificaram um desses aparelhos, mas… Não se encontram receitas desse tipo. Portanto mesmo que o modelo específico a ser modificado fosse extremamente popular no mundo inteiro de modo à receita ser aplicável no Brasil, esse é um caminho ainda não desbravado e por isso mesmo bastante arriscado.
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Por tudo isso, ainda que seja potencialmente um trabalho maior, caso o leitor se interesse em construir um dispositivo para esse fim, o sugerido é uma das receitas de máquinas "a partir do zero", sempre lembrando que ainda que tenha um componente lúdico e que valha a pena fazer também para "crescimento pessoal", geralmente toma um tempo que pode representar uma grande economia se ao invés do projeto for comprada uma solução pronta para uso. Ainda assim, essa solução permite o uso da criatividade menos confinada e adição de controles especiais para o acabamento, como medição de temperatura e ventoinha para maior fluxo de ar, e recursos preciosos como plataforma anti-aderente para evitar este efeito da peça úmida de solvente. Observação conveniente: ventoinhas são geralmente feitas de poliamida ou poliimida reforçada com fibra de vidro, compostos resistentes aos solventes que listamos.
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Havendo disposição e tempo, a receita "Maker" mais popular na web descreve um aparato que usa partes de um mini-umidificador ultrassônico portátil (dos que difundem vapor no ambiente, pouco maior que uma lata de refrigerante) e itens de prateleira como jarro de vidro, tubos de polietileno, lata de tinta vazia, conectores de rosca e bombinhas de ar. Opcionalmente permite controle por timer, constando também nas instruções.
Vantagens:
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Solução flexível, que pode ser construída de acordo com as necessidades de escala e orçamento que se tenha, podendo inclusive ser personalizada com temporizadores e microcontroladores ou itens que permitam aplicação em série.
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Itens de mercado de massa, com elementos e peças de reposição facilmente adquiríveis.
Desvantagens:
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Tempo, disposição e estudos necessários para se construir tal aparato. Caso seja para uma empresa de impressão 3D média ou grande, pode exigir um profissional dedicado para operação, manutenção e reparos.
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Fragilidade da solução, que não tem garantias de funcionamento e riscos grandes associados à construção interna.
Ora, recomendamos aparelhos especializados para o tratamento químico se a disposição para construir um for baixa, mas qual aparelho? No momento de publicação deste livro não há nenhuma comercializada no Brasil, mas existe uma criada por financiamento coletivo que virou um produto de verdade comercializado por uma companhia de Taiwan, a Magic Box.
Ela trabalha com uma câmara hermética em que se põe a peça e um compartimento para o solvente, que é borrifado para câmara formando uma névoa que ataca a peça. É também com vapor frio, mas o controle se vê pelos botões da máquina: tem timer, regulação de intensidade e medidor para troca do filtro. No entanto, cabe lembrar que esta tecnologia ainda está em sua infância, e a máquina, vendida por 600 dólares, tem tido muitas reclamações e na sua capacidade máxima esgota o tanque de solvente em 20 segundos. É garantida apenas para acetona, com o risco de uso de outros solventes ficando por conta do usuário.
Esse é um dos exemplos de mercado ansiando por soluções e na falta tendo que recorrer a procedimentos caseiros e inseguros. Empreendedores makers não têm falta de fontes de idéias para criar dispositivos e itens que dominem o mercado. Muito provavelmente a fragilidade de funcionamento da MagicBox vem das dificuldades de se conter e lidar com um composto perigoso como a acetona. Tendo isso em vista, a empresa Polymaker pensou em uma solução bastante criativa: por que não criar um filamento de impressão 3D especial que funcione com um solvente menos perigoso e tolerado por máquinas, e criar conjugado a ele uma máquina que o aplique? Esse é o ponto do filamento Polysmooth™ e da máquina aplicadora Polysher™, que usam o solvente de prateleira álcool isopropílico (isopropanol), que não ataca componentes eletrônicos e é barato e largamente usado pela indústria.
Vantagens:
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Uma empresa por trás do aparelho dá segurança legal e técnica para o tratamento químico.
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Solução pronta e simples, sendo apenas necessário a compra do insumo (solvente) e manutenção preventiva.
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Necessidade muito menor de treinamento de pessoal.
Desvantagens:
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Tamanho único — e pequeno. Não servirá para peças grandes.
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Ainda não há solução comercial que use aquecimento do solvente, que é o tratamento mais efetivo.
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Fragilidade das soluções, em um mercado ainda incipiente.
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Indisponibilidade no Brasil — necessidade de importação. Isso também dificulta manutenção e reparos.
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No caso do filamento especial PolySmooth™, a necessidade de importação do filamento é um obstáculo. Além disso, o fato de ser atacado por um solvente tão comum e abundante tem o efeito de tornar as peças impropícias para muito usos em que estarão expostas.
O uso de solventes de plásticos é tradicional na indústria de injeção e "chegou pra ficar" na da impressão 3D de baixo custo. Além do acabamento, a mente criativa dos makers tem utilizado solventes para todo tipo de tarefa relacionada à impressão 3D. O "suco de ABS", como foi batizado, uma mistura de cerca de 5/6 de volume de acetona e 1/6 de volume de resíduos de ABS (geralmente suporte triturado), vira um líquido colorido que pode ser usado para:
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Passar no vidro e criar uma fina camada de plástico, servindo como "cola" para evitar warp e descolamento durante a impressão.
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Revestir a peça de forma a engrossá-la e permitir curvas mais orgânicas e artísticas, e também recuperar a cor, ou no caso de plástico de cores diferentes, servir como tinta.
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Funcionar como cola para unir partes diferentes, já que o solvente evapora e o que permanece é apenas o plástico. Dessa maneira, se tem uma peça contínua do mesmo material com cicatrizes mínimas.
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Preencher delaminações, buracos e falhas de impressão eventuais sem deixar vestígios.
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Reforçar seções finas. É de se notar, aliás, que os solventes deixam a resistência das peças maior no sentido vertical (por aumentar a aderência entre camadas, visto que o plástico dissolvido penetra nos intervalos entre elas) mas menor no plano XY (pois aumentam levemente a porosidade ao atacar a polimerização do plástico). São um antagonista da anisotropia da impressão 3D FFF.
É importante notar que algumas dessas estratégias podem pedir por misturas mais espessas — por exemplo, cobrir buracos pode funcionar melhor com uma mistura de 2/3 de acetona e 1/3 de ABS. Além disso, embora o suco de ABS seja o mais conhecido, os outros solventes e seus plásticos também funcionam — por exemplo, é possível fazer "suco de PLA" com clorofórmio, o problema está em esses compostos serem bem mais tóxicos e o perigo de ter contato tão próximo com eles em tarefa de revestimento, colagem e pintura tornar essas operações muitíssimos mais perigosas.
Quando uma peça de impressão 3D é fabricada, o processo todo submete o material a várias tensões localizadas dado principalmente às diferenças de temperaturas entre os vários pontos em que o filamento é depositado. Muitas dessas tensões ("estresses") acabam se traduzindo no warp do material que mencionamos, mas outras não chegam a ser aliviadas na geometria do material. Essas tensões contribuem para diminuir a aderência entre camadas, causar efeitos de fadiga, mudanças de cor, rachaduras e deformação com o tempo. Em partes translúcidas e transparentes, tais tensões podem causar níveis diferentes de refração da luz no aspecto do material, prejudicando o efeito estético.
Para aliviar esses estresses localizados, existe a técnica de recozimento ou, em inglês, annealing, que vem de outros tipos de fundição industrial. A idéia é deixar a peça em temperatura elevada por várias horas, às vezes por dias (caso de lentes de vidro, por exemplo). Esta temperatura elevada se situa acima da temperatura de transição vítrea (tg), mas abaixo da temperatura de derretimento (tm), de modo que as moléculas do material passam a ter alguma liberdade para se moverem, mas não excessiva de modo que a forma possa se desmanchar. Assim, elas lentamente "relaxarão" e removerão o stress, resultando em uma peça mais forte, mais isotrópica e resistente ao tempo, e em certos casos para peças impressas um acabamento melhor também é conseguido visto que as linhas de camada ficam menos visíveis. O recozimento também pode ter o efeito, em filamentos específicos preparados para esse fim, de cristalização das moléculas, ou seja, formação de estruturas organizadas que aumentam a rigidez e resistência do objeto — o "HTPLA" da empresa Proto-Pasta com fibra de carbono é um exemplo disso.
Idealmente o recozimento seria um processo controlado e demorado, com o forno esquentando lentamente para dar tempo para o equilíbrio térmico acontecer entre as partes internas e externas da peça impedindo o warp ao máximo. Na prática, adicionar ainda mais tempo ao já demorado processo da impressão 3D não é uma boa idéia, e fornos com esse tipo de controle de tempo — geralmente muflas microcontroladas com "rampas" de temperatura — são caros e pequenos. Então um equilíbrio entre custo, tempo e temperaturas é buscado.
O resultado também varia muito com o material, até mesmo nas dimensões que são mais afetadas. E a princípio, parece consensual que o processo não funciona com ABS, sofrendo este material deformação inaceitável com a temperatura. Algumas formas mais propensas a warp podem necessitar de reforço adicional em certos pontos para impedir a deformação e o melhor momento para realizar o recozimento é imediatamente após a impressão terminar, antes mesmo de a peça esfriar — portanto se o forno tiver volume para tal, levar a peça ainda grudada ao vidro quente para dentro dele é recomendado.
Embora no ramo industrial o recozimento seja um processo bem controlado, conhecido e usado, na impressão 3D de baixo custo não parece existir ainda corpo teórico científico e acadêmico consistente de como o conduzir. Os testes documentados de alguns estudantes da Universidade Estadual do Arizona1 são um começo, embora nas recomendações coloquem uma temperatura especialmente alta e um tempo curto para o PLA (30 minutos a 140°C) — outras fontes oferecem valores bem mais conservadores, como o vídeo de Thomas Sanladerer sobre o processo2 (110°C por uma hora). Nas experiências do autor deste livro, os valores menos agressivos do Thomas se aplicam melhor aos filamentos que usa.
Note ainda que como o recozimento pode em princípio ser feito em um forno comum, não existem estudos analisando possíveis resíduos ou contaminação nos alimentos assados no mesmo dispositivo, e tendo ciência das partículas ultrafinas do processo de extrusão e das substâncias tóxicas presentes no vapor do plástico, toda cautela é pouca — recomenda-se usar um forno dedicado a essa função.
Note
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Notas:
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Tratando de impressão 3D FFF, pintura surge como um assunto inevitável, até pela limitação da tecnologia em fabricar com cores diversas. Se por um lado é verdade que existem muitas peças em que a pintura é irrelevante, o fato é que para muitas ela é parte da função e para outras ela se apresenta como uma indispensável vantagem de acabamento. Além disso a pintura pode atuar como reforço, proteção, revestimento e para omissão dos incômodos e aparentes relevos de camada e serrilhamentos que aparecem nas peças (função que compartilham com as massas de preenchimento, que por conveniência trataremos em conjunto).
E para podermos entender como a pintura funciona, vale a pena aprendermos um pouco por trás da ciência de materiais envolvida. Considerando pintura como todo revestimento dos objetos impressos em 3D para fins de aspecto e funcionalidade, os compostos da pintura, as tintas, permitem decorar, proteger contra rachaduras e envelhecimento e também melhorar as características da superfície protegida.
Tinta não é somente um líquido colorido. A tinta é uma mistura mais ou menos complexa1 de diferentes compostos, e em sua formulação podem ser encontrados:
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Aglutinantes: a resina, também conhecida por ligante ou veículo, é o componente que vai formar o filme seco e o único cuja presença é obrigatória. É classificada de acordo com o mecanismo de cura, sendo os quatro mais comuns a evaporação, reticulação cruzada, polimerização e coalescência.
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Corantes ou pigmentos: em forma de pó, são envoltos pela resina (líquida) e são os encarregados de dar cor à peça.
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Cargas: em forma de pó, são também envoltos pela resina, encarregando-se de melhorar as propriedades físicas e condicionar o aspecto final.
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Solventes: regulam a viscosidade do produto ao método de aplicação e as propriedades de cura deste. É volátil e não se torna parte do filme seco da tinta.
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Aditivos: são compostos que, mesmo usados em pouca quantidade, proporcionam grande efeito no produto em suas propriedade físicas e químicas, como melhorar estabilidade e compatibilidade dos pigmentos, conferir propriedades anticongelantes, melhorar a textura, catalisar reações, emulsificar a mistura, promover aderência e outros.
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Ceras: melhoram o tato e orientam partículas metálicas — como sais de alumínio.
Uma fórmula contendo estes compostos forma uma suspensão dos pigmentos e cargas na resina — sendo insolúveis nela -, ao mesmo tempo em que esta resina está em solução com o solvente.
De modo geral, os plásticos de impressão 3D não têm condições ideais para a fixação de tintas, adesivos e metalização, devido a suas superfícies quimicamente inertes ou com baixa energia superficial. A aderência da tinta ao plástico dependerá de três fatores: tensão superficial (energia de superfície), molhabilidade e compatibilidade química. A tensão superficial é função da coesão entre as moléculas do líquido; na sua superfície, essa força tenderá a ser maior porque as moléculas mais externas não estão ligadas às outras por todos os lados, dispersando menos as forças de atração e formando um filme invisível interfaceando o meio externo. Esse filme faz com que o movimento de um objeto seja mais difícil na superfície do líquido do que quando ele está completamente submerso. A força necessária para romper um filme de 1cm de comprimento é chamada de tensão superficial e medida em dinas (10-5 N) por centímetro.
Para um líquido formar uma superfície uniforme sobre um sólido — o efeito que desejamos ao aplicar nele a tinta -, é necessário que sua tensão superficial seja inferior às forças adesivas entre o líquido e o sólido2. Quando isso ocorre, considera-se que o líquido tem boa molhabilidade, ou seja, ele se espalha sobre o sólido. Este índice pode ser medido pelo ângulo de contato entre o líquido e a superfície, quantificando a afinidade entre o líquido e o sólido. Com ângulo próximo de zero, a molhabilidade é máxima.
A tensão superficial de tintas líquidas situa-se entre 36 a 38 dinas/cm para tintas à base de solventes e entre 40 e 45 dinas/cm para tintas à base d’água. Quando uma tinta líquida é aplicada sobre o polietileno sem tratamento, será visível a formação de gotículas, já que a tensão superficial da tinta é superior às forças adesivas entre a tinta e o plástico (30 dinas/cm).3
Segue uma tabela4 de tensões superficiais e ângulos de contato de plásticos utilizados em impressão 3D e utensílios de dia-a-dia.
Abreviação | Polímero | Energia de Superfície em dinas/cm | Ângulo de contato (graus) |
---|---|---|---|
Nylon 6/6 (poliexametileno adipamida) |
46 |
||
PC |
Policarbonato |
46 |
75 |
Nylon-6 ou Poliamida |
6 |
38 |
|
PET |
Polietileno tereftalato |
42 |
76 |
PMMA |
Polimetilmetacrilato (acrílico ou Plexiglas®) |
41 |
82 |
Poliimida (Kapton) |
40 |
83 |
|
PVC r |
Policloreto de Vinila (rígido) |
39 |
90 |
Poliéster |
41 |
70 |
|
Acetal |
36 |
85 |
|
PLA |
Ácido Polilático |
36-423 |
804 |
ABS |
Acrilonitrila Butadieno Estireno |
35 |
82 |
PVA |
Álcool polivinílico |
37 |
10 |
Poliacrilato (filme acrílico) |
35 |
||
PVC p |
Policloreto de Vinila (plasticizado) |
35 |
89 |
PS |
Poliestireno |
34 |
72 |
Nylon-12 |
36 |
||
PP |
Polipropileno |
30 |
88 |
PU |
Poliuretano |
38 |
85 |
PE |
Polietileno |
30 |
88 |
Borracha natural |
24 |
||
PDMS |
Polidimetilsiloxano (usado em cubas deSLAs) |
23 |
98 |
FEP |
Etileno Propileno Fluorado |
20 |
98 |
PTFE |
Politetrafluoretileno (Teflon™) |
19 |
120 |
Os poliolefinas — polímeros produzidos a partir de olefinas simples, ou alcenos como monômeros, como polietileno e polipropileno — são as que apresentam maiores dificuldades de aderência, porque além de possuíram baixa molhabilidade, são apolares, ou seja, incompatíveis com tintas e adesivos — esses sendo polares.
No âmbito industrial, os filmes plásticos são submetidos a certos tratamentos para modificar suas superfícies melhorando as características de aderência. Os três tipos mais comuns de tratamento são a corona (descargas eletrostáticas para aumentar a energia superficial), à chama (combustão de um gás sobre a superfície do filme, que é então resfriado imediatamente ao passar por água gelada) e químico (aplicação de um verniz/primer de modo a criar condições para a ancoragem de tintas, adesivos e outros revestimentos). O método da chama pode até ser usado "amadoristicamente" com peças de ABS, passando bem rapidamente um maçarico sobre sua superfície para polarizá-la, e logo depois o pintar.
Note
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Notas:
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Sabendo a composição e os princípios de aderência das tintas, podemos aprender quais usar. Existem diversos tipos de tintas no mercado, mas nem todas são propícias para usar com plástico.
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Tintas de PVA ou látex PVA são as mais baratas que se pode usar. São à base d’água, e embora sejam fáceis de aplicar até no plástico cru, não têm muita retenção — podendo ser limpadas facilmente com pano úmido. São geralmente foscas e secam rapidamente após a aplicação. Não são adequadas para peças expostas ao tempo ou umidade.
-
Tinta acrílica é o plástico acrílico (PMMA) com solvente; é também à base d’água e tem o aspecto semelhante à PVA, um pouco mais brilhante e forte em geral, embora exista a variedade fosca. Demora mais pra secar e se torna impermeável
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Tinta "PU" (poliuretano) ou epóxi. Bicomponentes, são também chamadas de tintas automotivas por serem comumente utilizadas em automóveis. São geralmente mais viscosas e não solúveis em água, também fazendo um bom trabalho de preenchimento, e dependem do catalisador para secar completamente. Uma vez seca, proporciona também ótima proteção à peça. Sua flexibilidade natural as protege de rachamentos.
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Tinta poliéster tem um aspecto brilhante, por vezes até metálico, mas é fina (não servindo para cobrir imperfeições) e não resiste muito ao descascamento, necessitando de verniz ou laca aplicado após a pintura.
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Tinta automotiva spray. Geralmente é tinta acrílica em aerossol para aplicação rápida.
Outros tipos de tinta — como esmalte, guache, tinta a óleo e tinta de tecido — não são geralmente ideais para o uso com plásticos de impressão 3D. Uma exceção pode ser o uso de esmalte de unha com pincel fino para desenhar detalhes na peça.
Além das tintas, a tarefa de pintura costuma pedir por alguns compostos que auxiliam o acabamento e melhoram a aparência e textura da peça, além de protegê-la de fatores ambientais:
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Primer. É um composto de cor transparente ou neutra (geralmente acinzentada) que pode até ser uma tinta, mas que tem a propriedade de ser bem aderente ao plástico e à tinta. Funciona como uma interface de promoção de adesão ("priming") entre a superfície e a tinta da cor que se deseja, aplicado portanto antes da tinta.
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Primer filler. É uma variedade de primer que além de facilitar a adesão da tinta, é espesso e pastoso, cobrindo imperfeições e reentrâncias e funcionando como um elemento de suavização da superfície. O tipo de primer filler mais comum é o de poliuretano ("PU").
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Massas corretivas são auxiliares ao primer com a função especificamente de corrigir riscos e imperfeições, como o primer filler. São colocadas antes do primer. Algumas marcas famosas são Tamiya Putty e Massa para pequenas correções Lazzudur Alto Sólidos. São também muito usadas por plastimodelistas e podem até ser modeladas para desenhar alguns detalhes. Uma solução substituta para a mesma tarefa pode ser utilizar massa corrida PVA epóxi bicomponente.
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Selantes são compostos que impermeabilizarão / selarão a peça pintada, usadas após a secagem da tinta. Alguns exemplos são goma laca incolor (totalmente transparente, e pode ser usada para fixar glitters e purpurinas), goma laca indiana (solúvel em álcool e com acabamento amarelado) e goma laca purificada (acabamento e fixação de glitter). Existem lacas brilhantes e foscas.
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Betumes são revestimentos usados para dar acabamento envelhecido.
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Vernizes são películas de acabamento, não necessariamente com propriedade selante. Alguns vernizes podem ser coloridos para complementar as tintas que cobrem. Existem vernizes brilhantes, texturizados e foscos.
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Revestimento próprio para impressão 3D. A conhecida empresa Smooth-On tem um composto chamado XTC-3D, feito especialmente para revestir peças impressas em FFF dando um acabamento brilhante e alisado. Resina de fibra de vidro epóxi pode substituir a XTC-3D que não é vendida no Brasil.
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Líquido Jet é um líquido à base de acetona utilizado no meio odontológico que pode ao mesmo tempo ter uma ação alisadora em plásticos como ABS e de revestimento por ter também base acrílica.
Vale notar que ao se usar tais compostos, quase sempre a peça ficará mais grossa. Com o nível de precisão das impressoras 3D FFF, 0,1mm a mais já podem ser suficientes para impedir que um encaixe funcione adequadamente ou que partes móveis se articulem. Pode ser necessário evitar a aplicação deles em locais críticos da peça ou então modelá-la antecipadamente mais fina para compensar o volume a mais gasto. Um dos jeitos de fazer isso é a "compensação horizontal", que veremos no capítulo de fatiamento.
Na escolha de auxiliares para o acabamento, é comum se encontrarem compostos à base de duas substâncias diferentes: nitrocelulose e poliuretano. Vale a pena vê-los em mais detalhes:
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Poliuretano: Já vimos as características da tinta de poliuretano e que ele é também usado para primer filler, mas existem também vernizes e fundos transparentes baseados nele. É um polímero plástico com consistência de borracha, bastante flexível, muito resistente quimicamente. Muito comumente são bicomponentes, com poliésteres poli-hidroxilados ou resinas acrílica poli-hidroxiladas no componente A, e no componente B o agente de cura, um poli-isocianato alifático ou aromático. Quando é utilizado o alifático têm alta resistência aos raios ultravioleta, quando é utilizado o aromático essa resistência não está presente. Devido à sua elasticidade é resistente a abrasão, o que impede que seja lixada depois de aplicada na peça. Costuma formar camada mais grossas, devido à sua viscosidade. Não funciona bem com pincéis, sendo necessária pistola de pintura ou aerógrafo.
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Nitrocelulose: Feito a partir da fibra do algodão. Pode ser entendido lembrando-se da celulose que é o principal componente da madeira e do papel, pois tem propriedades semelhantes. Serve para lacas, seladoras, vernizes e primers. É um produto bastante sensível a agentes químicos e solúvel em acetona, não servindo para proteger os plásticos desse solvente. Seus compostos serão geralmente mais baratos que os de poliuretano, tendo ótima aderência, entranhando no material e também secando rapidamente com camadas finas. Geralmente sua aplicação é monocomponente, dado que tem secagem rápida, e pode ser aplicada até com pincel. É um material biodegradável de fontes renováveis e por isso bastante ecológico e que, sem aditivos, não emana subprodutos tóxicos.
Muitos outros compostos podem ser usados mas sairia do foco desta obra. Felizmente, existe boa literatura sobre isso em português; para uma breve comparação entre poliuretano e nitrocelulose com vídeo de apoio, recomendamos o artigo no sítio web de marcenaria oficina44: http://oficina44.com.br/nitrocelulose-ou-poliuretano-pu/. Poliuretano é um material tão útil e versátil que tem sítio web em português com seu nome, e um livro inteiro online dedicado a ele: http://www.poliuretanos.com.br/livro/livro.htm. E para explorar toda a gama de revestimentos de proteção, temos a listagem do site especializados em tintas anticorrosivas: http://www.tintasanticorrosivas.com.br/informacoes-tecnicas/tintas-anticorrosivas/.
As tintas e compostos auxiliares precisam ser aplicados na peça, e os dois modos principais de o fazer são com um instrumento de contato como pincel ou brocha, ou borrifação como spray (aerossol) ou aerógrafo. Mas antes de tudo, é preciso lembrar que qualquer que seja o método usado, a necessidade de proteção novamente aparece.
Uso continuado das tintas exige basicamente o mesmo material que se usava com os solventes para acabamento. A máscara de gás com filtro para vapores orgânicos novamente deve ser usada aqui — a máscara de poeira não é suficiente, pois não filtra vapores. Luvas de nitrilo novamente são bem-vindas, e apenas o jaleco ou roupa contra contaminação pode ser trocada por uma roupa velha, grossa e que cubra todo o corpo, como um macacão e blusa de manga longa. A razão é que ao invés de ataques dos solventes simples, manchas de tinta acabarão aderindo permanentemente à vestimenta. É importante também faz a tarefa em ambiente arejado e ventilado — com ventilação que não escape para outros cômodos do edifício.
O método mais controlado de aplicação das tintas é o pincel, velho conhecido. O que não é tão conhecido de quem já não mexe com artesanato é que existem vários tipos de pincel, classificados pela largura do ferrolho, formato, tipo de cerdas e tamanho — essa última medida despadronizada e dependente de fabricante, com alguns relacionando a centímetros, outros a polegadas e outros sem relação com um sistema específico. A medida é dada em um número, que geralmente se situa entre 1 a 5 para os pincéis mais finos para detalhes e desenhos, 10-12 para os pincéis medianos propícios para cobrir uma peça de impressão 3D e 25 a 30 para caracterizar os pincéis de parede e grandes obras.
Mas o detalhe mais importante para os pincéis a serem usados na impressão 3D são as cerdas. Cerdas sintéticas, geralmente feitas de nylon extrudado, são mais firmes e aplicam melhor a cor na superfície sem deixar marcas. Por outro lado, cerdas naturais, como de pêlo de porco, são mais resistentes aos solventes e podem ser necessários para os trabalhos em que se usa solvente. Algumas cerdas naturais como pêlo de esquilo são bastante macios e bons para esfumaçar a tinta. Pincéis chatos costumam ser melhores para revestir a peça com cores uniformes, pincéis redondos para realizar tons intermediários e mudanças de cor. Ao se usar solvente ou thinner, sejam cerdas naturais ou sintéticas, é aconselhado deixar o pincel secar antes de molhá-lo novamente com tinta.
Existem várias áreas do conhecimento humano em que pincéis são usados, como pintura industrial, maquiagem, revestimentos e proteções. Para conveniência e brevidade, trataremos apenas dos de artesanato, com a lembrança que o espírito maker criativo pode utilizar sempre de ferramentas de outras áreas em um processo de "exaptação". E como sempre, referências adicionais são dadas para leitura complementar sobre o assunto1.
Demãos — o processo de pintura quase nunca é imediato — exige paciência, treino e método, não apenas no momento da aplicação, mas também na estratégia de aplicação de tintas e revestimentos. Na quase totalidade das vezes, apenas aplicar o líquido no material nunca dá o efeito desejado: ao secar, a cor pode enfraquecer, ou o líquido pode adentrar no poro e deixar seções sem cor, ou simplesmente ser insuficiente para trazer a aparência desejada. E aplicar maior quantidade ou fazer uma camada mais grossa de aplicação também não funciona: a maior tensão superficial impede que o líquido entranhe no material e impede a aderência necessária, criando também uma diferença mecânica entre a tinta e o substrato que facilitam sua remoção. Por isso, é sempre bom reservar um tempo adequado para se fazer várias demãos sobre a peça. As demãos são aplicações sucessivas de uma camada bem fina do líquido, com toda a duração necessário para a cura, secagem ou aderência completa ao material. Os materiais de aderência como o primer costumam exigir apenas uma demão e uma a 3 horas de cura, os de pintura exigem 3 a 5 demãs para máxima qualidade e algumas poucas horas para cura completa em cada demão, enquanto que os de revestimento, especialmente os mais grossos, costumam pedir de 1 a 2 dias e no máximo 2 demãos, sendo isso apenas uma regra geral com consideráveis exceções.
Limpeza do pincel — nada mais frustrante que pegar o pincel para cobrir sua peça e somente encontrar uma massa dura de cerdas que praticamente não tem mais utilidade. Ainda que seja um insumo descartável, a limpeza do pincel faz parte das boas práticas de acabamento e estende sua vida útil. A seguir algumas sugestões:
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Remova o excesso de tinta ou revestimento com pano ou papel absorvente, na direção da virola até a ponta — tendo o cuidado de não puxar as cerdas. Ajuda também passar o pincel em uma superfície que absorva o excesso.
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Com o excesso removido, mergulhe no solvente ou diluente (thinner) apropriado para o produto que está usando. Acetona ou thinner para produtos acrílicos ou poliuretano, álcool para goma laca e para produtos à base d’água, água morna com um ou dois pingos de detergente para quebrar a tensão superficial.
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Novamente passe o pano seco ou papel absorvente no pincel da virola até as pontas, de modo a secá-lo completamente. É útil também embrulhar as cerdas no papel absorvente para mantê-las secas.
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Se o volume de pintura é considerável e a variedade de cores utilizada é grande, vale a pena utilizar o mesmo pincel sempre para o mesmo material e coloração. Ainda que sejam às vezes imperceptíveis, resíduos da coloração anterior podem contaminar a pintura e piorar consideravelmente o aspecto da peça.
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Pincéis no fim da vida útil podem ser utilizados para os produtos de aderência como primer e primer filler, visto que neles a coloração não é importante.
Spray — uma alternativa ao uso dos pincéis são as tintas em aerossol (spray), especialmente por aderirem e entranharem mais facilmente às superfícies serrilhadas das impressões 3D. Outra vantagem é que sua natureza descartável significa que não precisam de limpeza. Por outro lado, os aerossóis servem apenas para áreas grandes de pintura (até porque precisam de certa distância da peça — geralmente uns 30 cm ou mais) e embora sejam ótimos para degradês, não funcionam para detalhes. Além disso, não têm a mesma flexibilidade que um pincel para entrar em áreas internas da peça. Mas o pior dos sprays é o custo. Uma lata de spray rende muito pouco em relação a um pote de tinta equivalente, mesmo os mais caros. Além disso, os recipientes usados exigem reciclagem especializada.
A solução às limitações do spray existe e se chama *aerógrafo*. É um instrumento que basicamente serve para borrifar de maneira controlada praticamente qualquer líquido, servindo inclusive para acabamento com solventes. Não é um instrumento especialmente barato — mas dado o preço das latas de spray, a economia que se tem usando este instrumento compensa os gastos iniciais após poucas dezenas de aplicações.
Assim como os pincéis, os aerógrafos são um instrumento com muitos tipos e facetas e não conseguiríamos dar mérito necessário a eles sem ocupar centenas de páginas do livro. Seguem algumas notas breves sobre o uso de aerógrafos em impressão 3D:
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O aerógrafo utiliza um compressor de ar comprado à parte. Para trabalhos em que não se exija muita pressão ou tempo de trabalho contínuo, que se supõe ser o da maioria dos casos da pintura de peças, o compressor de ar portátil ou mini-compressor2, que costuma custar entre 40 e 60 dólares, é recomendado pela praticidade e preço. O compressor de ar fixo é mais poderoso e pode trabalhar continuamente por várias horas mas vai custar mais de 150 dólares.
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Existem vários tipos de "canetas" de aerógrafo, citadas nas referências3. Para praticidade, o recomendado para uso com peças de impressão 3D é o aerógrafo de gravidade de mistura interna e de dupla ação, com abertura de 0,3mm. Esse tipo de aerógrafo permite o controle da pressão da "mistura" de líquido e água que será borrifada assim como a abertura do facho, potencializando controle fino da pintura ou revestimento que se aplique. Com esse controle, o aerógrafo pode ser usado tanto em fachos finos para detalhes de desenho na peça quanto em fachos largos para cobertura de tinta ou revestimento.
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A parte mais sensível do uso de aerógrafo é acertar as proporções de diluição da mistura com thinner que vai no recipiente acima da caneta. Uma proporção muito grossa fará o facho ser irregular, expelir perdigotos ou até entupir; uma proporção muito rala fará o facho ser fraco e não aderir corretamente à superfície. A consistência e diluição ideais variam de acordo com tinta e fabricante e são obtidas por um processo de experiência, tentativa e erro4.
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